Uma comissão da Câmara formada por 20 juristas negros tem 120 dias para rever e aperfeiçoar a legislação brasileira sobre racismo. Instalado oficialmente (nesta quinta-feira, 21) por meio de uma reunião virtual, o grupo pretende dotar o sistema jurídico de instrumentos para combater problemas como o encarceramento em massa da população negra, a violência das abordagens policiais e o cruzamento do racismo com outros tipos de discriminação, como o machismo e a homofobia. No documento de criação da comissão, o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), destacou que as populações negra e indígena são as mais atingidas pela violência e pela pobreza. Durante a cerimônia de instalação do grupo, Rodrigo Maia disse que, a partir de 2 de fevereiro, quando deixa a Presidência, estará em Plenário ajudando no aperfeiçoamento da legislação. “Daqui pra frente, com esse trabalho, vamos fazer uma nova história, uma história importante, aonde nós vamos certamente conseguir tirar da nossa história essas notícias, todos esses dramas do cotidiano, do dia-a-dia que muitos vivem com esse racismo estrutural que existe no nosso país”. A comissão de juristas tem como presidente o ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na reunião de instalação do colegiado, ele lembrou que o Brasil foi o maior território escravagista do Ocidente e o último das Américas a abolir a escravidão, tendo a segunda maior população de origem africana do mundo. O ministro do STJ acrescentou que o racismo precisa ser tratado em duas dimensões. O racismo institucional, segundo ele, é menos evidente e se reflete, por exemplo, na desconfiança de agentes de segurança sobre a população negra sem justificativa. A outra vertente é o racismo estrutural, ainda menos perceptível. “O racismo estrutural está cristalizado na cultura do povo de um modo que, muitas vezes, nem parece racismo. A presença do racismo estrutural pode ser constatada pelas poucas pessoas negras que ocupam lugar de destaque nas instituições”. Tanto os juristas quanto parlamentares que compõem a bancada negra na Câmara reivindicaram a ampliação da comissão, com participação de representantes da sociedade civil. A deputada Áurea Carolina (Psol-MG), do PSOL de Minas Gerais, enfatizou a importância desta sintonia para a melhoria da legislação antirracista. “Sem esse diálogo com a participação popular, nós não teremos um avanço na quantidade e na intensidade, que é preciso nesse momento”. Muitos discursos lembraram o assassinato do negro João Alberto Freitas a partir de uma abordagem de seguranças de um supermercado de Porto Alegre em novembro do ano passado. Foram ressaltados itens a serem discutidos na revisão das leis, como as ações afirmativas e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, como a Convenção Interamericana de Combate ao Racismo, ratificada pela Câmara em dezembro. O relator da comissão de juristas, o professor de Direito Silvio Luiz de Almeida, sintetizou o objetivo do grupo. “A missão que tem no meu coração é honrar os meus ancestrais, é também salvar vidas e é também apontar um caminho, juntamente com os meus companheiros e as minhas companheiras que aqui estão pra que este país se torne um país melhor, um país mais justo, um país mais digno”. Uma das leis que pode ser revista pela comissão de juristas é o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010). O grupo será assessorado por dois consultores legislativos da Câmara e poderá convocar acadêmicos e especialistas para participar das discussões. Deputados da bancada negra vão propor que a comissão se torne uma estrutura permanente. Da Rádio Câmara, de Brasília, Cláudio Ferreira.
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